segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

O COVID NÃO DÁ DIREITO A “INCELÊNCIA”

 “(...) Uma incelência pra ele

Desce um anjo do céu vem lhe ver

Espere aí meu anjo do senhor

Que eu vou pro céu mais você”...

É costume e tradição desde os tempos idos a prática de se promover as chamadas “incelências”, uma espécie de homenagem póstuma para os que se vão para o outro lado. No sul de Pernambuco, na zona da mata canavieira, é costume – pelo menos era – cantar as ladainhas no “quarto do defunto”. Quando morria um morador de algum engenho, os parentes se dirigiam ao delegado da cidade para pedir permissão e a devida licença para realizar a “incelência”. Providenciado o caixão, e uma roupa decente para o defunto, (com algum dinheiro um retratista para documentar a cena: a família em volta do defunto já estirado no caixão). O passo seguinte do ritual ir a bodega do engenho comprar garrafas de aguardente, bolacha e velas. Tudo arrumado, em volta do caixão, passam a noite toda cantando “benditos”, ladainhas e ofícios, tomando cachaça e comendo bolachas, acompanhando o “tirador dos cânticos”, naturalmente uma pessoa que sabe ler.

Aqui e acolá  nos intervalos  surge um gaiato que torna o quarto menos pesado, contando anedotas ou episódios vividos pelo defunto ou outros finados conhecidos. Outros relembram velhas histórias dos que morreram e depois “enviveceram”.  Ou a história de um “corpo santo” um  que foi enterrado  num local e tempos depois seus restos mortais não estavam mais lá, e sim, a metros de distância.

                  Cena do filme "Dilema de Carpideira"

Nesse cenário a viúva nem tem tempo de chorar. Passa a noite servindo a uns e outros, e, às vezes se esquece até do finado.

Não sabemos por que motivo ficou tão arraigado no espírito do nosso povo interiorano esse ritual de cantos. Não sabemos a origem do tal “quarto de defunto”. E o que falar das  Carpideiras”?  quem sabe a origem? grupos de mulheres piedosas - que mediante contrato - vão  rezar os terços e encomendar os defuntos vertendo lágrimas com  choros e lamentos em voz alta. Uns afirmam que há registros delas desde a Idade Média. Uma tradição que ainda resiste ao tempo em Juazeiro do Norte e em várias regiões do Nordeste.

Bendito e louvado seja

A luz que mais alumeia

Valei-me, meu padim Cíço

E a mãe de Deus das Candeia

Ô que caminho tão longe

E cheio de tanto arrodeio

Os romeiros vem chegando

E é noite de lua cheia

Os anjos cantam no céu e no mar

Canta a sereia

 

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